24 de jul. de 2009

O bê-á-bá do broadcasting: os hábitos de consumo

por João Claudio Lins

Mylena Ciribelli, apresentadora do "Esporte Fantástico", recém-estreado


Palavras de um grande diretor de comercialização e marketing, Álvaro Iahnig: "TV é hábito". Sentença que ouvi exaustivamente durante os três anos que trabalhei em uma rede de televisão. Praticamente uma lavagem cerebral. O óbvio ululante do planejamento em broadcasting. Tão evidente e intuitivo, mas que alguns executivos parecem desprezar.

O resultado do descaso: grades voadoras, programas que estréiam e são cancelados antes de completarem um mês no ar e – principalmente – um enorme desrespeito ao telespectador.

Criar e desenvolver hábitos de consumo são práticas que a Rede Globo adota – com sucesso - desde os anos 60. A conseqüência dessa sistematização é a notável fidelização de audiência que a emissora mantém, mesmo com o avanço das redes concorrentes.

Dados do Painel Nacional de Televisão do mês de junho apontam para uma confortável liderança para a Vênus Platinada, com 16,8 pontos de média diária, ante 5,7 da Record e 4,9 do SBT.

A diferença da grade da Rede Globo para suas duas principais concorrentes é justamente a previsibilidade do que vai ao ar. Ou seja, o telespectador sabe qual será a próxima atração. Já está consolidada no consciente coletivo brasileiro a disposição da programação: "Vale a Pena Ver de Novo", "Sessão da Tarde", "Malhação", 'novela das 18h', 'das 19h', "Jornal Nacional", 'novela das 21h' e linha de shows. É sempre assim, necessariamente nessa ordem. Experimente agora citar a do SBT ou a da Record.

A rede de Silvio Santos experimentou o dissabor de perder público devido às inconstâncias na programação. Uma estrutura tão volúvel que se tornou um mistério para o telespectador. O disse-que-disse tomou proporções maiores quando o patrão – em um dos seus espasmos criativos – resolveu fechar a assessoria de imprensa da casa, cerrando o contato com os formadores de opinião. Uma espécie de Ato Institucional: centralizador, ditador e insano.


Tal postura deixou não somente o público perdido, mas também os funcionários do canal. Fato que rendeu um embaraçoso episódio no principal telejornal da emissora, o "SBT Brasil": a apresentadora, que deveria anunciar a atração seguinte, ficou embasbacada, sem imaginar o que ia ao ar (veja vídeo acima). A produção tampouco. Quem salvou a cena foi o experiente Hermano Henning, que finalizou o assunto com um sorriso amarelo.

Ao que parece, Senor Abravanel aprendeu a lição. Hoje já dá para supor a programação noturna do SBT: linha de shows 1, telejornal, novela e faixa especial. Até quando a grade será mantida é uma incógnita, mas o homem do Baú dá indícios de que vai honrar a fórmula. A não ser que ele acorde com o dente doendo. Aí tudo pode mudar. Ou não. Vai saber.

No mesmo caminho está a Rede Record, cada dia mais inconstante. De acordo com a coluna Outro Canal, a emissora mudou a sua grade em São Paulo pelo menos 24 vezes num período de 57 dias. As alterações começaram em maio, quando Geraldo Luís deixou de apresentar o "Balanço Geral SP" para dar lugar à edição carioca.

Entre as reformas, houve também a ampliação do "Hoje em Dia" e mudanças no horário do "Domingo Espetacular" e do "Repórter Record" por conta da estreia de "A Fazenda", em 31 de maio. O caso mais recente foi o 'Esporte Espeta...' digo, "Esporte Fantástico" que, em sua 3ª apresentação, teve seu horário radicalmente corrompido, passando das 12h para às 08h30.

Todas essas alterações repentinas expõem insegurança e imaturidade por parte dos executivos das redes de TV. Uma aflição desenfreada por resultados financeiros e comerciais que pode afetar um importante elemento desse negócio: a credibilidade.

Diante de uma derrapada no Ibope, mais vale fazer como a Globo, que leva a temporada até o término do seu ciclo (mesmo que antecipado) para somente depois cancelá-la. A série "Tudo Novo de Novo" e a malfadada novela "Negócio da China" são alguns exemplos. O respeito, assim como nas relações pessoais, deve se refletir também profissionalmente. Essa perda pode ser irreparável.

Pensando bem, agora entendo meu ex-diretor, quando bradava incansavelmente que TV é hábito. Uma repetição salutar para todos os departamentos. O bê-á-bá da administração, que muitas vezes se perde no meio do caminho.

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1 comentários:

Philipe Satheler disse...

Ótimo texto, parabéns joão!

24 de julho de 2009 às 20:51