10 de jan. de 2010

TV Crítica: As novas receitas da dramaturgia nacional

por João Claudio Lins

2010 promete grandes novidades. As emissoras estão armadas, com produtos bons e novos formatos. Até mesmo a Rede Globo, com a sua folgada liderança, abriu mão, no último ano, da zona de conforto e arriscou propostas ousadas, estéticas e narrativas, como as séries "Decamerão", "Som e Fúria" e "Norma". Sinal de que a dramaturgia brasileira evoluiu, ficou mais madura e mais rentável. E não somente nos arredores do Projac. A Rede Record, por exemplo, mostrou que é possível fazer novela fora da sede global e chegar a um nível próximo do "Padrão Globo de Qualidade". O SBT rompeu contrato com a Televisa e partiu para as produções 100% nacionais, apoiadas em textos antigos de Janete Clair e Vicente Sesso. O panorama é otimista.

A produção dramatúrgica na TV aberta surpreende: são 7 telenovelas inéditas no ar. Um cardápio bem interessante para consumidores ávidos por este tipo de produto. Aí que entra a provocação desta coluna: com relação à estrutura narrativa, quais dos títulos em cartaz são realmente inovadores? O que você, telespectador, prefere: um bom feijão com arroz ou um marreco ao molho de café? Uma novela tradicional (e previsível) ou um enredo inusitado e surpreendente?

A TV vive de faturamento. Ponto. Por mais que haja excelência na produção artística, o que movimenta a folha de pagamento é o retorno comercial. A produção e a audiência em massa. Um modelo ainda em uso, mas já absolutamente condenado pela entrada do sinal digital.

Vamos à velha e boa metáfora gastronômica: hoje, a TV aberta tem que alimentar grandes conglomerados de audiência com uma mesma receita. Básica e pasteurizada. Daqui a alguns anos, o cardápio vai aumentar, assim como a procura por novos pratos. O bandejão popular vai perder adeptos. Logo, o telespectador vai querer – e poder – consumir o que tiver vontade: desde um ovo frito até uma lagosta. Do programa da Márcia a um seriado Cult.


Com a segmentação da audiência, as novelas poderão criar novos formatos e investir em outras propostas. Se isso será economicamente viável aí são outros quinhentos. Porque a ousadia tem seu preço. Pode render excelentes investimentos ou mesmo causar um enorme prejuízo. A Record, por exemplo, lançou dois produtos com linguagem inovadora: a malfadada novela "Metamorphoses" e a bem-sucedida trilogia dos 'Mutantes', de Tiago Santiago. Mesmo com todas as críticas, o autor conseguiu a façanha de alcançar picos de liderança no Ibope. E isso tudo no tempo da TV analógica, com público massivo, efeitos especiais grosseiros e um enredo fantasioso. Uma receita que agradou em cheio parte dos adolescentes. Tão popular quanto uma porção de batata frita. Uma é pouco, duas é bom. Três é demais. E dá náusea no final.

O arroz com feijão, aquele bem temperadinho, com os ingredientes na medida certa, entretanto, também tem seus adeptos. E é justamente essa receita que o autor Tiago Santiago (sim, o mesmo dos 'Mutantes') vai utilizar para reavivar a dramaturgia do SBT. Trata-se da adaptação de "Uma Rosa com Amor", de Vicente Sesso.

A trama, produzida pela 1ª vez em preto-e-branco em 1972, foi exibida com grande sucesso na Rede Globo. Veiculada no horário das 19h, contou com 220 capítulos, com destaque para a atuação de Marília Pêra como a solteirona Serafina.

"Uma Rosa com Amor" foi uma das primeiras novelas da Globo com elementos de comédia romântica, o que se tornaria, mais tarde, a marca do horário das 19h. Na versão de Santiago, com a colaboração de Renata Dias Gomes e direção-geral de Del Rangel, o enredo vai permanecer fiel ao original, com temas já bastantes conhecidos pelo público: amor, casamento, família, disputas, traições, cobiça, solidariedade e amizade. As questões serão abordadas por uma perspectiva doce e bem humorada.

Seguindo referências do neo-realismo, "Uma Rosa com Amor" brinca com perfis estereotipados e cômicos, como a moça que ficou sem namorar depois de uma grande decepção amorosa, o fanho, a nova rica ambiciosa e fútil, o malandro e o pai protetor.


O elenco escolhido é popular e reúne nomes como Carla Marins, Luciana Vendramini, Etty Fraser, Isadora Ribeiro, Betty Faria, Carlo Briani, Claudio Lins, Monica Carvalho, Edney Giovenazzi, Toni Garrido, entre outros.

Maria Cláudia, Tiago Santiago, Lúcia Alves e Del Rangel


O SBT parece estar disposto a retomar – pela enésima vez – a sua dramaturgia. A emissora, conhecida pelos espasmos criativos do patrão, já adotou inúmeras cartadas ousadas, como a reprise de "Pantanal", da extinta TV Manchete.

Desta vez, a estratégia é outra: trilhar um caminho conhecido pelo público e apostar no óbvio ululante. Uma receita, a princípio saborosa, que pode virar praxe na mesa ou mesmo enjoar no decorrer dos dias. Prefiro o marreco ao molho de café, mas ainda assim devo experimentar esse novo prato-feito do Silvio Santos. Numa dessa eu acabo gostando.

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